O Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU) divulgou, no dia 13 de abril, nota técnica sobre Projeto de Lei do Senado (PLS) 1.179/2020, que trata das alterações no direito privado em função das ações de combate à disseminação da COVID-19. Além da ampliação das medidas de suspensão das remoções compulsórias, o documento apresenta instrumentos temporários para proteção da moradia que, embora fujam ao escopo das relações de direito privado, o IBDU entende como relevantes na contenção do novo coronavírus.
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O IBDU defende a suspensão, em todo território nacional, da retomada compulsória de imóveis utilizados para moradia. Segundo o Instituto, a interrupção deve perdurar enquanto não esteja superado o contexto de isolamento social recomendado pelas autoridades sanitárias. A medida não se limita às ações de despejo advindas de relações locatícias, mas também às ações de reintegração de posse, ações reivindicatórias, ações de imissão de posse de imóveis públicos e privados, entre outros. “Em que pese o PLS 1179/2020 versar apenas sobre relações de direito privado, vale também frisar, na linha da proteção integral da moradia preconizada nesta nota técnica, que idêntica atenção devem merecer, no presente momento, os desalojamentos praticados pelo Estado, que se manifestam tanto pela via judicial, quanto extrajudicial, valendo-se de entendimento a respeito da autoexecutoriedade das decisões administrativas, que tem sido objeto de diversos questionamentos quando o bem jurídico ameaçado é a moradia, especialmente no caso da população de baixa renda”, diz a nota.
Para o coordenador da Comissão de Política Urbana do CAU/RJ, Lucas Faulhaber, a suspensão de qualquer decisão de desalojamento, no contexto de combate à COVID-19, é de extrema importância. De acordo com o arquiteto e urbanista, os processos de remoção, além de gerarem deslocamentos de pessoas, expõem a população removida a situação de maior precariedade e de exposição ao vírus, como o compartilhamento de habitação com outras famílias e, em casos extremos, a morarem na rua. Nesse sentido, o Poder Judiciário de diversos estados emitiu decisões suspendendo remoções por conta da pandemia do novo coronavírus, a exemplo do Tribunal de Justiça da Bahia e do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
A nota técnica alerta ainda para os prejuízos que a suspensão do prazo de aquisição por usucapião pode gerar ao titular de domínio ocioso pelo não cumprimento da função social da propriedade. O IBDU considera a referida suspensão como uma medida assimétrica e injusta, que maltrata o espírito jurídico. “Decerto, tal situação gerada por meio desse dispositivo previsto no PLS nº 1.179/2020, além de não significar qualquer forma de apaziguamento jurídico por força da pandemia de COVID-19, decerto acarretará insegurança jurídica pela assimetria de trato da matéria, consistente em majoração da proteção jurídica do direito de propriedade em detrimento do princípio da função social da propriedade, ambos objeto de mesma tutela jurídica previstos no art. 5º da Constituição Federal”, afirma o Instituto. Lucas Faulhaber lembra que a usucapião especial é uma das formas de a população de baixa renda ter acesso à terra e a garantir seu direito à moradia, através da regularização fundiária. “O PLS 1.179/2020, aprovado no Senado e remetido à Câmara dos Deputados, restringe esse mecanismo (usucapião) e suspende os prazos para que as famílias possam comprovar a posse da terra, ainda que nesse momento tão delicado.”, explica.
Outros instrumentos apresentados pela nota técnica do IBDU para garantir a proteção da moradia são: criação de disposição em favor do locador que comprovadamente dependa da renda de aluguéis para sua subsistência, fazendo estender a esse os benefícios oferecidos aos pequenos empresários e MEI, em termos de acesso a renda emergencial ou a crédito subsidiado e adiamento de obrigações tributárias; condições especiais para o parcelamento de aluguéis em atraso durante o período da pandemia, extensivas às locações não residenciais e às comerciais, nos casos de locatários de pequenas, médias e microempresas, além dos MEI e dos trabalhadores autônomos; proibição do fornecimento de água, energia elétrica, água, gás de cozinha encanado, serviços de telefonia e internet; e condições especiais para pagamento das contribuições condominiais por parte dos moradores dos condomínios edilícios.