CAU/RJ se manifesta contra aprovação do PLC 174/2020
Em defesa do planejamento urbano e da dignidade do exercício da profissão do arquiteto e urbanista, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU/RJ), através da Comissão de Política Urbana, manifesta-se contra a aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLC) 174/2020. A iniciativa, proposta pelo Poder Executivo Municipal do Rio de Janeiro, permite o descumprimento da legislação urbanística vigente, mediante o pagamento de contrapartidas.
Enviado à Câmara de Vereadores, no dia 11 de maio, em regime de urgência, o PLC apresenta argumento absolutamente inaceitável em sua justificativa: “gerar recursos para o enfrentamento das crises sanitária e econômica oriundas da pandemia da Covid-19”. Leis urbanísticas com finalidades puramente arrecadatórias são medidas recorrentes na cidade do Rio de Janeiro, sempre contando com a contrariedade da categoria dos arquitetos e urbanistas.
O PLC pretende flexibilizar normas urbanísticas exigindo em troca o pagamento de contrapartida financeira para o licenciamento e legalização de construções no município do Rio de Janeiro, reeditando, mais uma vez, a famigerada “lei da mais valia”, porém sem estabelecer qualquer prazo de término. Mas não é somente isso. A Prefeitura visa ainda a estabelecer novos parâmetros urbanísticos de forma indiscriminada, recuperando fragmentos de propostas legislativas anteriores muito criticadas pela sociedade, bem como a ampliação de benefícios para a reconversão de hotéis, o aumento de gabarito e a alteração nas regras de afastamento em diversas áreas da cidade. O chefe do executivo municipal permite ainda a construção de novos tipos de edificações acima da cota 100.
A aprovação do PLC 174/2020 representa ameaça de danos irreversíveis à paisagem carioca, que ostenta título da Unesco de Patrimônio Cultural da Humanidade, sob o argumento de emergência da pandemia e da crise financeira que assola a municipalidade. A adoção de tal expediente avança em lógica perversa para a cidade, sem avaliações sobre suas consequências para a infraestrutura urbana e o ambiente construído como um todo. O PLC carece ainda de mecanismos que possibilitem o controle do poder público sobre a valorização extraordinária de determinadas áreas ou imóveis.
Mais uma vez, um PLC que trata de matéria urbanística é apresentado sem estudos técnicos que justifiquem e embasem as propostas nele apresentadas. A proposta não foi objeto de discussão com a população, de debate em audiência pública, nem sequer pautada no Conselho Municipal de Política Urbana (Compur), em que o CAU/RJ tem assento.
Ressalta-se que as medidas de distanciamento social não são justificativas para eliminar o necessário debate público em torno de projetos de lei dessa natureza. Os recursos disponíveis para a auxiliar a participação pública são inúmeros, não como substitutivos dos espaços presencias de debate, mas como alternativas profícuas para a promoção do diálogo com a sociedade neste período. Destaca-se ainda que esse PL, apresentado pelo Poder Executivo Municipal, parece desconsiderar os esforços empenhados pela equipe técnica da Secretaria Municipal de Urbanismo no processo de revisão do Plano Diretor, que vem ocorrendo em diálogo com diversos setores sociais e conta com o apoio e a participação deste Conselho.
O novo projeto de lei é avesso aos princípios que regem o planejamento urbano e extrapola o mecanismo da “mais valia” que tem sido utilizado, há décadas, para regularizar obras realizadas à margem da legislação urbanística vigente sob o mesmo argumento da necessidade de arrecadação para os cofres municipais. No momento em que os governos locais devem estar dedicados a salvar vidas e a preservar o funcionamento do sistema de saúde pública, ao mesmo tempo em que necessitam pensar e planejar a cidade pós-pandemia, o Projeto de Lei 174/2020 representa uma visão absolutamente negligente em relação ao futuro da nossa cidade.
O CAU/RJ se coloca à disposição para articular a categoria profissional dos arquitetos e urbanistas no sentido de indicar contribuições técnicas para tomadas de decisões dos gestores. Passada a crise, seguiremos à disposição para que essas contribuições se alarguem e possam fomentar políticas públicas de planejamento do espaço construído em prol de cidades mais justas.
Rio de Janeiro, 18 de maio de 2020
Comissão de Política Urbana
Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro