As diversas escalas do planejamento foram discutidas no primeiro dia da II Conferência Estadual de Arquitetos e Urbanistas do CAU/RJ, realizada na sede do IAB-RJ.
“A cidade precisa do projeto em todas as suas escalas”, afirmou o presidente do CAU/RJ, Jerônimo de Moraes, durante a abertura da II Conferência Estadual de Arquitetos e Urbanistas do Rio de Janeiro, nesta segunda-feira, na sede do IAB-RJ. “A valorização do projeto não deve ser entendida como uma defesa corporativa da profissão, mas uma forma pela qual a sociedade tem mais segurança e controle sobre as obras públicas”, acrescentou.
A II Conferência e o 5 Encontro com a Sociedade, realizado sábado, foram organizados pelo CAU/RJ com apoio institucional das entidades que formam o CEAU: Abap, Abea, Asbea, IAB-RJ e Sarj. Jerônimo de Moraes destacou a colaboração das entidades de arquitetura e urbanismo para a escolha do tema da Conferência.
O presidente do CAU/BR, Haroldo Pinheiro, durante a abertura, disse que, entre outros pontos, o projeto contribui para garantir o cumprimento do orçamento e do cronograma desejado. “Projetar é preciso”, afirmou parafraseando o poeta português Fernando Pessoa. “A defesa do projeto é uma resposta ao investimento que a sociedade fez na nossa profissão”, observou.
O presidente da FNA, Jeferson Salazar, o diretor de Relações Institucionais da Asbea, Aníbal Sabrosa, a diretora da Abea Wanda Vilhena, a coordenadora da Abap-Rio, Monica Bahia, e o presidente do IAB, Sérgio Magalhães, também compuseram a mesa. Salazar destacou a importância da discussão sobre as atribuições privativas dos arquitetos e urbanistas, enquanto Monica Bahia falou sobre a atuação da Abap na valorização da paisagem brasileira e na formação profissional do arquiteto paisagista.
Já Sergio Magalhães, fez uma apresentação sobre as cidades brasileiras do século XXI e o paradoxo albertiano. A contradição é que para construir, é preciso projetar. No entanto, quanto mais se constrói, menos se projeta.
“O Brasil foi capaz de construir um sistema urbano extremamente positivo, porque foi capaz de acolher uma população com crescimento explosivo. No entanto, há grandes passivos em relação ao saneamento e à desigualdade, por exemplo”, ponderou. Sérgio Magalhães fez também um alerta sobre o futuro de nossas cidades. “Nos próximos 20 anos, serão construídos 50% do volume produzido até agora. Isso é um enorme desafio e responsabilidade”, disse.
O primeiro Diálogo do CAU do dia teve a presença do arquiteto e urbanista Flavio Villaça, que questionou a eficácia da obrigatoriedade dos planos diretores para municípios com mais de 20 mil moradores. “O Brasil talvez seja um dos poucos países no mundo em que a Constituição faz essa previsão. No entanto, há leis que não ‘pegam’”, afirmou. Villaça questionou se o plano diretor é uma peça técnica ou política. “As promessas de campanha nem sempre respeitam o que é determinado pelo plano diretor”, observou.
As escalas do planejamento: a Cidade e a Metrópole
“Essa conferência, ao tratar da urgência do projeto, retoma uma discussão que já foi importante, mas perdeu espaço”, afirmou o arquiteto e urbanista Affonso Accorsi na primeira mesa de debate, com o tema “As escalas do planejamento: a cidade e a metrópole”, com coordenação de Rosemary Compans, Coordenadora da Comissão de Política Urbana do CAU/RJ.
Accorsi falou sobre novas escalas urbanas e citou a formação das “gigapoles”, como a que reúne as cidades de Boston, Washington, Chicago e Pittsburgh, nos Estados Unidos. “Estão surgindo novas formas de ocupação das cidades e escalas. Discute-se, hoje, uma nova urbanidade. A capacidade de intervir depende dessa percepção”, disse. Ele lembrou ainda que nesses cenários, a tecnologia tem um papel cada vez maior.
O arquiteto e urbanista observou que, de 1873 a 2004, a cidade do Rio de Janeiro teve dez planos, enquanto a região metropolitana não teve nenhuma experiência significativa nesse ponto. “A ausência do planejamento metropolitano levou a uma compreensão do plano como um somatório de planos municipais”, lamentou.
“O Grande Rio encontra-se diante do grande desafio de construir uma gestão metropolitana que alcance a confiança dos entes federados e representantes da sociedade e se coloque em condições de reduzir efetivamente as desigualdades”, complementou o subsecretário de Habitação de Duque de Caxias, Kelson Senra, depois de apresentar dados sobre o município da Baixada Fluminense.
A memória e a paisagem urbana: o projeto e o partido
“A memória é uma das maiores responsáveis pela construção de nossa identidade, mas ela não funciona sozinha, depende de um suporte, que é a paisagem”, afirmou o coordenador da Comissão de Ensino e Formação, Leonardo Mesentier.
A arquiteta e urbanista Claudia Brack, da Fundação Parques e Jardins, explicou a atuação do órgão e apresentou as transformações paisagísticas em praças cariocas, em que muitas alterações não levam em conta o projeto original. Já Lia Motta, do Iphan, apresentou a evolução do conceito de patrimônio por meio de um histórico das Constituições Federais. “A conservação do patrimônio molda a paisagem”, afirmou.
A qualidade da concepção de projeto e da execução da obra
O professor da UFRJ Pablo Benetti ressaltou a importância de os arquitetos e urbanistas acompanharem o projeto até o fim da obra. “As obras das quais me orgulho são aquelas que participei até o fim. Nossa preocupação deve ser até o momento da entrega da chave seja para o poder público, seja pela população”, disse.
Fazendo alusão ao arquiteto e urbanista Rem Koolhaas, Benetti afirmou que a profissão do arquiteto e urbanista é um misto de onipotência, já que ele pode controlar todo o processo, e impotência, já que a materialização do projeto não depende somente dele. Benetti dividiu a mesa, coordenada pelo conselheiro do CAU/RJ Augusto Cesar Alves, com a ex-gerente Nacional de Entidades Urbanas (GEHUR) da Caixa Econômica Federal Eleonora Máscia, que apresentou, ao falar de habitações de interesse social, exemplos das construídas por meio do programa Minha Casa Minha Vida Entidades.
O ensino e a ética do projeto
O arquiteto e urbanista Marcos Konder, um dos autores do monumento aos mortos da Segunda Guerra Mundial, professor aposentado, abordou o ensino da arquitetura. Entre os pontos que julga fundamentais no ensino estão uma formação voltada para o futuro e a capacidade de raciocínio espacial cada vez mais ampla, que permita enfrentar qualquer tipo de proposição arquitetônica. “A arquitetura deve ser encarada como uma obra aberta, já que a sociedade está em constante transformação”, afirmou.
Fundador do escritório Pontual, Davino Marques dos Santos Pontual disse que o arquiteto e urbanista precisa ficar atento porque ao ferir a ética está ao mesmo tempo desvalorizando a profissão. Ele exemplificou citando o fato de alguns profissionais não cobrarem por anteprojeto.
O projeto de arquitetura: o êxito no desenvolvimento do projeto completo
No último Diálogo do CAU, Filipe Jacopucci, sócio do escritório RRA, apresentou alguns dos projetos da empresa. Segundo ele, o projeto deve ser legível, mensurável e executável. O arquiteto e urbanista da RRA, em sua defesa do projeto completo, explicou que a medida não envolve apenas as etapas do planejamento, mas também o acompanhamento da obra e a utilização do prédio depois de construído.
O arquiteto e urbanista Indio da Costa defendeu a ampliação do número de concursos públicos de arquitetura no país e apontou algumas práticas que contribuem para a desvalorização da profissão. “O mercado nos impôs algumas condições das quais não soubemos nos livrar, como o estudo preliminar gratuito e o fatiamento do projeto”, lamentou.
O coordenador da mesa, o Conselheiro do CAU/BR pelo Rio de Janeiro, Luiz Fernando Janot, falou sobre importância da luta pela valorização da profissão e também sobre a relevância do tema escolhido para a II Conferência, “A cidade e a Urgência do Projeto”. Ele também lembrou que, entre outros benefícios, os concursos são uma oportunidade de o jovem mostrar um trabalho de sua autoria. Já Aníbal Sabrosa defendeu que os profissionais cobrem pelos estudos de viabilidade das obras. “O êxito do projeto completo está no respeito ao profissional”.
Texto: Marta Valim (Especialista de Comunicação)
Fotos: Fernando Alvim / Divulgação CAU/RJ e Marina Mendes – Ascom/CAU/RJ